HOMENAGEM FEITA EM 2008 AM RUA LEIDE das NEVES. MANAUS AM

HOMENAGEM FEITA EM 2008 AM RUA LEIDE das NEVES. MANAUS AM
20 anos depois procurar meus direito tomados!

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

feridas ocultas!

Feridas ocultas 20 anos depois
Vítimas buscam indenizações, tratamentos médicos e psicológicos duas décadas após a tragédia iniciada no antigo Bairro Popular, em Goiânia

12/09/2007

Publicidade Jornal Impresso - Anuncie!
Fechar anúncio

Matabem imunizadora de ambientes
(62) 3523 - 7500
www.matabem.com
“Quando cheguei ao Rio de Janeiro, a Leide ainda estava brincando.” A dona de casa Luiza Odet Mota dos Santos, 48, fala melancólica sobre as lembranças do acidente com o césio 137. Ela é tia de Leide das Neves, a menina que se tornou o retrato humano de uma tragédia química, e morava no barracão no mesmo lote para onde o pai da garota, Ivo Ferreira, levou a cápsula contendo o material radioativo para mostrar à família. Ao visitar o primo Devair, irmão de Ivo, que estava doente, Luiza foi para o quarto de Leide para ver a novidade. “Titia, vem ver a pedrinha brilhosa que o papai trouxe”, lembra o convite da sobrinha. Em seguida, Ivo entrou no quarto e, em tom de brincadeira, disse que faria com que a pedra ficasse bonita. Aplicou um pouco do pó azul em seu pescoço, local em que, até hoje, a dona de casa guarda uma profunda lesão. Luiza ainda pegou um pouco de césio 137 para mostrar ao marido, Kardec Sebastião dos Santos.

Esta, que é apenas uma das cenas do trágico acidente radiológico que se iniciou no antigo Bairro Popular, em Goiânia, completa 20 anos amanhã. Período longo para quem carrega o fardo de ter se contaminado com o elemento césio 137. Para o poder público, período curto para que se tome providências, reconheça os atingidos, faça valer os direitos. Após duas décadas, as feridas deixadas pelo césio continuam abertas em Goiás. Vítimas diretas e indiretas ainda lutam para conseguir aposentadorias, tratamentos médicos e psicológicos.

“Nós não vamos cruzar os braços. Não existe vontade política para resguardar as vítimas do césio 137 em Goiás”, desabafa Odesson Alves Ferreira, 52. Ele é uma das 16 pessoas que tiveram contato direto com o material radioativo em 1987 e preside a Associação das Vítimas do Césio. Odesson explica que 1.194 associados são vítimas do césio 137. Porém, em 1989, a Lei Estadual 10.977 garantiu pensão, assistência médica e acompanhamento pela Superintendência Leide das Neves (nome dado ao órgão que monitora as vítimas) a 122 pessoas. Na gestão do então presidente Fernando Henrique Cardoso, mais 127 pessoas conseguiram pensão por parte do governo federal.

Em 2002, um ajustamento de conduta garantiu benefícios a mais 417 vítimas a serem pagas pelo governo de Goiás, porém nunca receberam. “Elas não conseguem provar na Justiça o vínculo com o acidente. O Poder Judiciário baseia-se somente em provas factuais. Os critérios são muito técnicos, a Justiça não aceita como prova o endereço residencial, vínculo trabalhista, parentesco com vítimas contaminadas. Fica praticamente impossível comprovar”, destaca Odesson. Hoje, segundo ele, existem mais de mil processos nas justiças estadual e federal para tentar garantir pensão às vítimas. Na época, não foram feitos exames e provas periciais em grande parte daqueles que tiveram contato direto com pessoas contaminadas com o césio 137.

E a morosidade provoca mortes. Levantamento realizado pela Suleide aponta 52 falecimentos, entre os 734 cadastrados. Doze deles em decorrência de câncer, mas que não podem ser vinculadas à tragédia por falta de estudos que comprovem essa relação.

CICATRIZES
Kardec Sebastião dormiu, sem saber, com um pouco do material radioativo debaixo do braço, o que provocou uma lesão profunda. No outro dia cedo, Luiza foi visitar a sogra na cidade vizinha de Anápolis sem imaginar que estava irradiando radioatividade. Lá, contaminou várias pessoas, entre elas, uma sobrinha de apenas 1 ano de idade. “Eu prefiro não falar muito sobre o assunto. Nós sofremos demais, o que aconteceu com nossa família foi muito grave.” Luiza foi levada ao Rio de Janeiro (RJ) para tratamento e só retornou para casa três meses depois. “Foi muito triste. Separei-me dos meus quatro filhos, não sabia o que poderia acontecer comigo e com eles. No Rio de Janeiro, usávamos somente materiais descartáveis. Tudo que a gente tocava era considerado lixo radioativo.”

O aposentado Jorge de Morais Rego Ribeiro, 51, também é personagem da tragédia. Trabalhava como motorista da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) no Rio de Janeiro, em 1987, ano do acidente com o césio em Goiânia. Ele conta que foi um dos encarregados pelo transporte de vítimas que tiveram contato direto com o material, ao desembarcar no Aeroporto Galeão, levadas por um avião da Força Aérea Brasileira (FAB). Foi Jorge quem levou Leide das Neves, Ivo (pai da garota) e outras pessoas transferidas para fazer tratamento de saúde e acompanhamento para a área de segurança reservada.

Segundo Jorge, as primeiras vítimas que saíram da Capital ficaram isoladas em um local restrito e com proteção à radiação no Hospital Naval Marcílio Dias. Ele afirma que grande parte dos funcionários da Cnen não possuia equipamentos de proteção adequada para o trabalho envolvendo vítimas e lixo radioativo. “Acompanhei os dias de vida de Leide das Neves no hospital, vi de perto seu quadro de saúde piorar. Cheguei até a levar balas para ela no dia de São Cosme e Damião”, lembra. Jorge reside em Manaus, capital do Estado do Amazonas, há 14 anos. Tem um casal de filhos e defende o reconhecimento pela União de todas as pessoas envolvidas nos trabalhos e que foram contaminadas, como muitos policiais militares de Goiânia.

O motorista acredita que também esteja entre essa gente. Com o passar dos meses, em trabalho diário, transportando pessoas e lixo radioativo, Jorge começou a sentir inchaço no corpo e a perder peso. Pesava 72 quilos e emagreceu continuamente até atingir os 46 quilos. Além disso, teve úlcera, perdeu os dentes e teve problemas urológicos. Em 1992, ele foi aposentado por invalidez pelo Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Ele se sente injustiçado por não ter sido aposentado com o salário proporcional ao que ganhava como motorista e também por não ter recebido indenização pela contaminação que sofreu.

“Hoje, recebo apenas um salário mínimo. Na época, eu recebia cerca de oito vezes mais. É uma injustiça!”, desabafa. Jorge chegou a entrar com processo de revisão de aposentadoria, mas sem resultados. A vontade dele era ser enquadrado como inativo do Cnen, autarquia federal criada em 1956 e vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia. A comissão atua como órgão de planejamento, orientação, supervisão e fiscalização. Estabelece normas e regulamentos em radioproteção e licencia, fiscaliza e controla a atividade nuclear no Brasil.

Nenhum comentário: